“Eis que faço novas todas as coisas” (Ap 21, 5)

0

Queridos irmãos e irmãs

Em determinados momentos da vida desejamos muito que surja um novo tempo e se escreva uma nova página da história. Firmes na Palavra do Senhor é sempre possível recomeçar e fazer tudo novo de novo. O Espírito de Deus nos encoraja a nos reinventarmos. Deixemo-nos recriar pela Palavra de Deus, para uma nova orientação de vida nesta caminhada quaresmal.

A palavra-chave deste tempo é conversão; uma transformação séria em nós é possível porque Deus é amor em acção e Ele tudo pode. Este tempo é uma porta favorável que se abre diante nós.

Na mensagem para a Quaresma deste ano, o Papa Francisco nos lembra que Deus vê e escuta, está atento às situações de escravidão e dor do seu povo, por isso, decidiu descer para o libertar (cf. Ex 3, 7-8). Também hoje o grito de tantos irmãos e irmãs oprimidos chega ao céu.

Os relatos que nos chegam a cada instante põem em evidência que o mundo está doente e em decadência.

Enfrentamos desafios de violência, hostilidades entre os povos, ondas crescentes de rivalidades e intolerância um pouco por toda a parte.

A realidade faz-nos pensar que somos mais inimigos uns dos outros que irmãos. Diante desse cenário, questionamo-nos: como justificar tantos conflitos e guerras inimagináveis num mundo que busca progresso e luta pelos direitos humanos?

Quem nos poderá livrar do peso do pecado e deste fardo que a humanidade carrega?

Sozinhos, não somos capazes; precisamos do olhar solícito de Deus e da sua intervenção paterna.

A Quaresma, como caminho para a Páscoa, é entrada na via da libertação. Deus persiste em nos procurar, oferecendo-nos a oportunidade de reintrodução na vida. Este é o momento de se recentrar no caminho da fraternidade, da luz verdadeira e da liberdade.

Esta jornada rumo à Páscoa é uma aventura pessoal e comunitária alcançada no horizonte da esperança. Há que descobrir a esperança no meio das nossas guerras, entre os escombros do horrendo, entre os pobres, os frágeis e os desprotegidos que continuam a ser objectos de exploração pelos poderosos e por sistemas económicos que impiedosamente asfixiam e matam.

A proposta da Igreja para nós é clara: converter dos nossos maus caminhos: semear a beleza que abre a nossa imaginação ao transcendente, o bem e a verdade, porque isso é o remédio que nos repõe na senda da santidade.

Diz Francisco que: “É tempo de agir e, na Quaresma, agir é também parar: parar em oração, para acolher a Palavra de Deus, e parar como o Samaritano em presença do irmão ferido”, porque “o amor de Deus e do próximo formam um único amor”.

O deserto quaresmal é “parar na presença de Deus, junto da carne do próximo. “Por isso, oração, esmola e jejum não são três exercícios independentes, mas um único movimento de abertura, de esvaziamento: lancemos fora os ídolos que nos tornam pesados, fora os apegos que nos aprisionam.”

Com o Papa, cremos que se “esta Quaresma for de conversão, a humanidade extraviada sentirá um estremeção de criatividade: o lampejar duma nova esperança”.

A Renúncia Quaresmal deste ano, após ter ouvido o Conselho Presbiteral, será para as vítimas da guerra em curso entre Israel e Hamas; um gesto de solidariedade e participação no seu sofrimento, que fazemos em colaboração com a Caritas Jerusalém.

A Renúncia Quaresmal de 2023 em favor das famílias mais pobres que carecem de segurança alimentar rendeu 489.289$00. Não nos falte a ousadia da caridade; cada um dê como dispôs em seu coração, sem tristeza nem constrangimento, pois Deus ama quem dá com alegria (2 Cor 9, 7).

Que a espiritualidade da nossa Quaresma nos infunda coragem, luz e força para prosseguir a caminhada, aguardando os novos céus e a nova terra (cf. Ap 21, 1).

Mensagem do Bispo de Mindelo para a Quaresma 2024.