O que inibe uma ambição explícita da mulher ao poder?

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A representatividade da mulher nos altos cargos de liderança, tem sido tema de várias fóruns e debates, diria até, nas “conversas de café”. É notório que se intensificaram os debates em Cabo Verde, onde é consensual o inicio da temporada politica, uma antecipação, que para alguns, poderá comprometer tanto a luta pelo poder como dificultar as possibilidades de negociações.

Importa refletir onde as mulheres se enquadram nessa luta, que por um lado, há uma leitura intencional de “desinteresse” e por outro lado, uma lista de “obstáculos” com que as mulheres se deparam na luta pela ascensão ao poder, nas posições de liderança. Durante a minha pesquisa sobre a temática, fiquei aliviada em saber que os obstáculos são globais, não se restringindo à realidade cabo-verdiana.

Nesse sentido, pretendo com esse artigo de opinião, partilhar a minha análise inspirada em aspetos de estudos que já foram realizados além-fronteiras e ajustar a nossa realidade, na esperança de que possa servir para ajudar as mulheres a se consciencializarem dos obstáculos que irão encontrar num processo de ascensão à liderança. É importante encará-los numa ótica de melhoria da “gestão e definição de estratégia” do que na “vitimização”, este segundo posicionamento geralmente desperta sentimentos contraproducentes como o “paternalismo”, o foco deverá ser na “meritocracia”.

É notória que a representatividade das mulheres vem crescendo ao longo dos anos, em diferentes esferas, com destaque para a política, mas as dificuldades ainda persistem. O cerne da questão é entender como a mulher se revê nessas dificuldades e superá-las.

Estudos revelam que as mulheres no processo de liderança , possuíam uma noção mais endógena – mesclando aspetos masculinos e femininos- do que a sugerida pela literatura. Nessa luta ao poder, constata-se , no dia a dia comentários que demonstram, claramente a natureza preconceituosa, nomeadamente relacionadas com “o facto” da mulher ser mais fraca, mais frágil, ou não ser boa o suficiente. Nem sempre é verbalizada, geralmente é mais do foro percetivo, mas marca, ofende e são extremamente prejudiciais. Conduta inadequada, gera normalização do preconceito, fazendo com que seja difundido, com frequência, a titulo de brincadeira inofensiva e não como algo agressivo e que segrega.

Condutas que precisam ser banidas numa sociedade em que as organizações políticas expressam abertura e criam medidas de políticas para que haja uma maior participação das mulheres, claro que, não devemos nos cingir as quotas.

Quando o assunto é networking, a mulher sofre da expectativa da “modéstia” e ao homem é propiciado um ambiente para exaltar dos seus talentos e realizações”.

A leitura mais comum, é de que existe pouco investimento em capital social, por parte das mulheres. Segundo Eagly e Carli (2007), o resultado mais destrutivo da dupla jornada das mulheres é o pouco tempo que sobra para a socialização com colegas e networking. Falar de si e reafirmar seu status e sua competência não é um comportamento comunal esperado das mulheres, isso causa estranheza, enquanto os homens podem exultar suas realizações; a modéstia é esperada até de mulheres muito bem-sucedidas (EAGLY e CARLI, 2007).

Constata-se que muitas mulheres têm dificuldade de estabelecer uma relação próxima ao chefe, que, em posições de hierarquia superiores, geralmente é homem. Nessas conjunturas, as mulheres acabam perdendo espaço nas promoções de cargo e salário.

O mesmo estudo, permitiu construir afirmações de que não existem a “expectativa de modéstia” do lado dos homens, por isso, podem ressaltar seu talento sem represália, constituindo um benefício. Aliado a isso, também têm a chance de cultivar relações mais próximas a chefes homens, por compartilharem interesses, sem ter a chance de alguém achar que a relação profissional entre ela e o chefe é uma relação amorosa inapropriada – um reparo, muitas vezes associado às mulheres, acrescento que é uma realidade também constatada em Cabo Verde, onde o meio é muito pequeno.

Muitos são os fatores que podem travar uma manifestação de ambição mais explícita, das mulheres ao poder. As razões que estão na sua base podem estar ligadas, desde o medo de falhar, a falta de referências de pessoas com trajetórias comuns, no topo. É evidente que, tendo referências, torna mais fácil se imaginar, um dia naquela posição. Por exemplo vejam quantas mulheres temos como Presidentes de Câmaras em Cabo Verde?

A trajetória promete ser árdua, mas não impossível. O preconceito e os obstáculos, nem sempre são percetíveis para que possam ser trabalhadas. As mudanças de paradigma que se esperam, também não produzem efeitos imediatos. Quanto maior é a ambição, maiores são os obstáculos!

Posicionar-se, eis o caminho! Posicionar-se de forma pró-ativa, realista, aumenta as chances de haverem mais mulheres na política, em posições de topo, que não sejam, meras exceções e consideradas casos individuais de sucessos.

Aliado a todos esses desafios do género feminino, para qualquer orientação de género é preciso acautelar-se de “jornadas suicidas”, que na minha opinião, resultam em descalabros irreparáveis.

É preciso deixar de “se impor” pelo ego ou evitar “ser imposto” por critérios que não sejam os naturais, como a confiabilidade para comandar os destinos de um país ou Concelho e ainda, carisma – nitidamente marcada, por algum dom natural, longe disso, seria uma aposta falida.