“No caso concreto de Cabo Verde, o MPD, partido da oposição, e com vocação de poder, tem tarefa bastante difícil de gerar alternativas ao PAICV, uma vez que a matriz das ideias que tem do desenvolvimento, em nada difere das do partido que exerce o poder.
No essencial, estão de acordo quanto ao formato do Estado mínimo e as respetivas funções; ambos propugnam pela privatização e pela não intervenção do Estado na economia; estão também em sintonia quanto a liberalização do comércio e a economia do mercado; ambos defendem uma relação privilegiada com a União Europeia, com os Estados Unidos da América e com os países da CPLP; estão também de acordo quanto a vocação estratégica de Cabo Verde como centro de prestação de serviço, sobretudo na área de turismo e finanças internacionais; não há diferença, em termos teóricos, relativamente ao desenvolvimento social: ambos dão ênfase ao investimento na educação, na saúde e na formação profissional; ambos aceitam e executam, sem grandes reservas, as políticas ditadas pelas instituições multilaterais e organizações internacionais”
(José A. Reis – trecho de um artigo publicado no jornal a Nação em julho de 2011)
Este texto, em grande medida, confirma a atualidade política cabo-verdiana em matéria de políticas alternativas. Escrito em contexto um pouco diferente, é certo, mas diferenciando-se, os dois momentos, num pouco ou quase mais do que nada.
Afinal o que temos hoje?
Cinco anos depois de 2011, a situação inverteu-se.
E o que há de novo? O MPD é poder e o PAICV a oposição.
No essencial, houve alternância, mas não alternativas de políticas.
E o que se constata? O PAICV com muitas dificuldades em ser e fazer oposição, numa conjuntura em que o quadro sintomatológico, constatado em outros momentos, se repete, aqui, cristalinamente.
Aliás, fazendo uma análise aprofundada da estratégia de oposição do PAICV, de 2016 a esta parte, pode-se, facilmente, identificar 3 eixos essenciais:
a) A exigência, sem tréguas, do cumprimento das promessas eleitorais e pressão sobre o governo para a sua observância;
b) Não apoiar nenhuma proposta ou iniciativa relevante do governo, mesmo àquelas em que, manifestamente, não pode ser ou votar contra;
c) A tónica na suspeição e na falta de transparência na gestão da coisa pública por parte do governo, incluindo a judicialização da política, traduzida na submissão de várias queixas às instâncias da justiça.
Estes 3 eixos essenciais integram a estratégia do PAICV, facilmente identificáveis para qualquer observador atento e que acompanha a vida política cabo-verdiana.
Ela assenta-se numa linha de oposição de guerrilha, em que o discurso político coloca a tónica nas falhas procedimentais e na denúncia de casos, sendo este recorrente, numa clara intenção de provocar o máximo de desgaste ao governo, e com isso recolher eventuais dividendos políticos, sobretudo em franjas eleitorais, facilmente, levadas pela emoção ou então que sejam fiéis e indefetíveis ao partido.
Da oposição de apresentação de alternativas: zero.
Ademais, compreende-se mal de um partido com experiência e historial do PAICV ter optado por uma estratégia deste tipo. Contudo, deve-se considerar e atenuar um pouco esta apreciação, tendo em conta a expressiva derrota eleitoral que o partido conheceu em 2016, e sobretudo o conflito interno que teve de enfrentar desde 2011, aquando das eleições presidenciais.
Apesar, desses atenuantes, isso explicará tudo?
Acredita-se que não!
A estratégia assente em guerrilha, parece, em parte, destinar-se à sua base eleitoral e aos seus indefetíveis, que precisam ser animados e sossegados, mostrando, com essas ações, que o partido está a trabalhar e a lutar. Contudo, vendo bem as coisas, também não deixa de ser uma clara confissão de que não dispõe de soluções alternativas às atuais políticas desenvolvidas, achando o partido que a saída menos custosa é, sobretudo, a de contestar e não contrapor soluções.
O PAICV estará, certamente, ciente de que os partidos não ganham eleições, apenas, com discurso para os seus eleitores indefetíveis. Precisam também de ter um discurso e uma estratégia para atrair os eleitores do centro, que, por definição, é um eleitorado flutuante.
Os eleitores do centro, um pouco mais racionais, não se identificam com estratégias fundadas apenas na contestação e na guerrilha políticas. Esses eleitores interessam-se por propostas e por programas, e isso exige, a quem está na oposição, um trabalho de elaboração e produção, quer em termos de ideias quer em termos de propostas, opção que demanda um certo tempo para a sua concetualização, elaboração e maturação. Mas o PAICV pode não estar para aí virado, e acredita e faz a sua aposta na erosão e perda substancial de popularidade do poder existente, com a consequente ocorrência de alternância em consequência de um eventual castigo imposto pelo eleitorado às suas políticas.
Uma perspetiva descabida?
Nem por isso, na política tudo pode acontecer!
O que parece certo, face a estratégia adotada, é que o PAICV definiu como objetivo primordial, também, o regresso ao poder a curto prazo. Só assim se entende o estado de sofreguidão que se apossou das suas iniciativas e do seu discurso, em que a aposta é essencialmente a de provocar o maior desgaste possível ao governo, e no mais curto espaço de tempo. Para isso, achou não ser necessário construir alternativas, bastando, para o efeito, desacreditar o governo, e torná-lo, aos olhos da opinião pública, uma entidade não confiável.
Mas o PAICV faz isso porque o quer ou porque a isso é obrigado?
Parece que, em boa medida, a isso é obrigado, em razão de não ter uma alternativa programática credível ou melhor: haver uma não diferenciação programática geradora de alternativas. Resta-lhe esperar pela ocorrência da alternância, cujo ciclo em Cabo Verde, se não houver nenhuma situação anómala, é de 10/15 anos.
A tentação, certamente, é para o encurtar o máximo, mas não parece que a aposta, apenas, na guerrilha seja suficiente para gerar a alteração da extensão do ciclo.
Ora, voltando novamente a indiferenciação programática existente, nos partidos do arco da governação, quais seriam, verdadeiramente, as alternativas do PAICV para as atuais políticas desenvolvidas pelo governo?
O PAICV não poderá dizer que é contra as políticas de privatização, porque não tem como sustentar esta tese, enquanto partido moderno e de esquerda democrática, juntos dos parceiros externos que financiam grandemente as políticas de desenvolvimento do país e de uma certa elite interna;
Não poderá dizer que é contra a descentralização do poder porque eleitoralmente não lhe convém, e uma posição hostil a essas políticas teria consequência gravíssima na sua implantação autárquica;
Não poderá dizer que é contra o investimento estrangeiro e as parcerias estratégicas com empreendedores externos porque isso seria uma estratégia suicida para quem almeja um dia voltar ao poder;
Não poderá afirmar que é contra maior transferência de recursos para os municípios porque isso lhe acarretaria a oposição dos seus próprios autarcas, aumentando o nível de conflitualidade interna, ainda, existente;
Não poderá dizer que é contra o aumento das prestações sociais porque isso colocaria, desnecessariamente, os pobres contra si;
Não poderá dizer que é contra o aumento da escolaridade obrigatória para o 12º ano e a gradual isenção de propinas porque seria ir contra a juventude;
Não poderá dizer que é contra os programas de estágios profissionais porque, assim sendo, irá indispor os jovens que beneficiam desses programas;
E não poderá dizer que é contra as políticas de apoio a agricultores porque se se disser isso poderá perder o apoio das gentes do campo.
Eis aqui os grandes dilemas do PAICV: não poder dizer que é contra, mas também está proibido de dizer que apoia.
Sendo assim, o que faz o PAICV, então, para que tenha ações políticas visíveis e que possa chamar e prender a atenção sobre si?
É atacar de forma firme e forte a credibilidade do governo, lançando um rol de suspeição, já que em matérias de políticas está encurralado na indiferenciação.
E o resultado dessa operação?
O tempo o dirá, se será premiado ou profundamente castigado.
Comparar a matriz do MPD e o paicv na visão de desenvolvimento de CV, é querer agradar a “Gregos e Troianos”!!! na teoria pode parecer, mas na prática…
Oposição, neste caso o paicv, não bate palmas as iniciativas levadas a cabo por este Governo. Em vez de apresentar alternativas, procuram meios judiciários, e neste caminho poderá chegar em 2021, um pouco atrasado. Com este ritmo que o governo vem imprimindo no país, fixará o paicv impossível impor – se, por isso é que não tem alternativa.
O dilema do PAICV é mais profundo. Se concordo com a essência da análise do articulista, não deixo, no entanto, de notar que mesmo a estratégia de desgaste do Governo e do MPD com casos e factos ditos pouco claros se diluem na falta de credibilidade dos mensageiros do PAICV, começar pelo seu líder JHA. Que cabo-verdiano considera Janira e seu grupo mais sério ou mais transparente que Ulisses ? Nenhum, nem mesmo o David e a Ana Maria. Para além do facto da Janira e seus apaniguados estarem muito marcados por casos de desvios de dinheiros do Estado, o que os retira credibilidade, internamente a Janira desenvolveu estratégias de manipulação e falsificação de processos políticos que lhe tem permitido afastar dos órgãos do Partido boa parte das referências do PAICV. Isso terá custos !
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