Presidenciais 2021. FALÁCIA II: Agenda política e políticas públicas

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Os pressupostos da Candidatura de José Maria Neves não têm enquadramento constitucional e correspondência com a realidade política do país.

Eis alguns fundamentos da minha afirmação:

1. Fala da hegemonia do poder concentrado no MpD para justificar a eleição de um Presidente da República para reforçar ou proteger a Oposição de um poder esmagador, quiçá, uma ameaça à democracia, que estamos construindo.
Nada mais falso!

De 2001 a esta parte, tanto o MpD, como o PAICV têm governado o País com maiorias absolutas.

Nesses 30 anos, por vontade política do povo, a alternância na governação tem sido previsível e partilhada pelo MpD e o PAICV. Não se verifica nenhum domínio esmagador de um sobre o outro. O sistema de partidos em construção é tendencialmente bipartidário. Portanto, não há um Partido dominante em Cabo Verde, o que me autoriza a afirmar que a balança dos poderes está em equilíbrio, quaisquer que sejam as conjunturas políticas.

2. Um PR com uma Agenda Política para interferir na definição e execução de políticas públicas.

A agenda política pode ser influenciada por cidadãos, movimentos sociais, sindicatos, patronato, igrejas, etc. “quando os problemas da sociedade são percebidos pelos políticos (…) e justificam a intervenção de autoridades competentes” (Philippe Braud 1996).

Claro que o PR, no exercício da sua magistratura de influência, ausculta a sociedade, manifesta as suas preocupações e leva-as ao Governo, no estrito respeito pela aplicação do princípio da separação e interdependência dos poderes, mas não pode interferir na governação e nem sugerir a introdução ou mudanças na condução da governação.

O Governo presta contas ou Parlamento e cabe aos Partidos com assento parlamentar fiscalizar a ação governativa e propor alternativas ou melhorias na condução das políticas públicas.

Por outro lado “uma política pública se apresenta sob a forma de um programa de ação, que constitui um todo coerente, sob a responsabilidade do Governo” (Jacques de Maiilard e Daniel Kubler 2015).

O Presidente da República, no nosso sistema, não tem a função de fazer ” a agregação de interesses” ou seja “dar coerência e unidade aos interesses díspares” existentes na sociedade. Em democracias modernas, em sistemas parlamentar ou presidencial, a função de agregação dos interesses cabe aos Partidos Políticos.

No nosso sistema, o PR não tem poder nem a legitimidade para delinear ou sugerir a adoção de medidas de políticas públicas. Na nossa situação quem tem o poder e a legitimidade para definir e executar, com uma ampla autonomia, é o Governo, liderado por um I° Ministro, com base no Programa de Governo, aprovado juntamente com a Moção de Confiança pela Assembleia Nacional.

O PR não pode no nosso sistema, ter uma agenda política paralela de governação, tão-pouco debitar políticas públicas para o Governo executar ou ainda gerir programas e projetos, com estruturas e orçamentos próprios financiados pelo Tesouro, que são funções executivas da responsabilidade do Governo, constitucionalmente consagrada.

O instrumento que dá coerência às políticas públicas e pelo qual o Governo é políticamente responsável é o Programa do Governo. Portanto, é expectável que cada PR tenha o seu próprio estilo ou a forma de exercer a Presidência, mas não pode fazê-lo com base em poderes que a Constituição não lhe dá!

Muitos podem dizer que as minhas comunicações não passam de “blá-blá” e, tenho a consciência que não trazem nada de novo para muita gente formada ou que lida com as questões da vida política, mas faço este exercício porque, nunca é demais lembrar, que a democracia tem uma componente procedimental (cumprimentos das regras básicas e o respeito pelas instituições democráticas) intrinsecamente ligada a sua substância que lhe dá concretude, como dizem os brasileiros, no processo de criação do bem comum e da realização da prosperidade geral.

Eleger o Presidente da República é tanto sério e exigente como escolher o Governo!



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