Era uma vez um Ministro que criou uma “jurisdição paralela” e agora, no cume do delírio, dá fervorosas “lições” sobre Ética, Estado de Direito, Karl Popper e Constituição!

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Fernando Savater, um dos maiores filósofos e pensadores de Espanha, diz-nos, num ensaio magnífico, que, dependendo dos respectivos contextos, há vários tipos de mentira.

O que exige, aliás, uma leitura subtil e uma hermenêutica mui sábia e adequada, capaz de distinguir, digamos, o trigo do joio.

Há mentiras aceitáveis, explica o renomado Professor da Complutense de Madrid, no âmbito do cinema, da poesia e mesmo das relações sociais de cortesia.

Sabemos que aquilo que vemos num filme ou lemos num romance não é propriamente verdadeiro, mas, mesmo assim, compreendemos a sua utilidade profunda.

E aceitamos, então, pacificamente, essa como que “distorção” propositada da verdade e da realidade.

A ficção, tantas vezes incorporada nas Artes, é uma forma sublime de aprendizagem. Reconhecidamente.

Porquê? Porque são situações (ou criações culturais, rectius) que, já com palavras de Savater, “…nos podem iluminar sobre aquilo que é a realidade…”. Vejamos.

1984 é uma obra de ficção. Mas não deixa de ser, como bem sabemos, um poderoso meio de compreensão e descodificação dos mecanismos internos do sistema político totalitário, seja ele de matriz nazi ou estalinista.

O filme O Padrinho, dirigido, na sua “belle époque”, por Francis Ford Coppola e com as inesquecíveis interpretações de Marlon Brando e Al Pacino, é capaz, por sua vez, de nos elucidar sobre o universo da Máfia (italiana e não só) melhor do que o mais rigoroso e imparcial relatório burocrático-policial.

O mesmo sucede no mundo da chamada “etiqueta”.

A vida social tem, deveras, a sua dose de dissimulação, de exagero.

A verdade muitas vezes é insuportável!

Os elogios que fazemos, por exemplo, a uma figura pública, ou a alguém do sexo oposto, nem sempre são verdadeiros! Mas é assim. É uma questão de simpatia.

Tudo isso é, no fundo, um sacrifício que consentimos em nome das normas da boa convivência. Que dulcificam a nossa labuta diária.

Não se pode, de todo, ignorar a boa educação e a cortesia e é precisamente por isso, esclarece ainda F. S., que “as nossas relações mútuas assentam neste tipo de amabilidade”.

Todavia, há mentiras inaceitáveis, gravosas, perversas e que revelam, à luz do dia, uma personalidade defeituosa e notoriamente sem princípios.

São mentiras, estas últimas, lesivas da confiança pública, como diria Savater.

Envenenam as engrenagens da democracia e não deixam a sociedade progredir, nem a Liberdade florescer.

Impedem, se se quiser, a formação de padrões e bons exemplos.

Denigrem o verdadeiro espírito da Justiça (ou “Esprit des Lois”, na célebre formulação de Montesquieu).

Merecem, por conseguinte, ser denunciadas, escrutinadas e devidamente combatidas.

A patranha anda (normalmente) de braços dados com a manipulação.

A mentira dolosa corrói, na senda de Maquiavel, os alicerces da Polis.

Há, pois, mentiras daninhas. Eivadas de má-fé.

Nas palavras do filósofo espanhol, em jeito, dir-se-ia, de severo alerta: “Tais são as mentiras perigosas, as que não podem ser passadas por alto”.

Vem isto a propósito de um artiguelho do sr. José António dos Reis publicado no Expresso das Ilhas (n.º 1104, de 25 de Janeiro de 2023, páginas 10-11) e no qual o cidadão, nas vestes de justiceiro informal e divertido “analista judicial”, distorce gravemente os factos e, sem qualquer pudor, inventa uma espécie de “realidade paralela”, que depois, desajeitadamente, tenta vender à opinião pública cabo-verdiana e, pois claro, aos mais incautos.

Esse mesmo dr. José António dos Reis que, na década de 1990, fez figuras tristíssimas e deploráveis nesta sociedade, lembrando, enfim, pela sua postura, certos ditadores de má memória.

JAR fala muito de “práticas e atitudes”.

Recordemos, então, e em síntese, as dele: na sequência do caso das profanações, o homem resolveu, ocupando a importante pasta de Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro, montar uma espécie de “jurisdição paralela”, mandando buscar (com que legitimidade?), na cadeia, determinados presos, que depois foram interrogados no seu gabinete ministerial e, diga-se, com aparelho de escuta e gravação das conversas!!!

O nosso Sherlock Holmes iria desvendar todos os crimes e, assim, sossegar o país…

A confissão do próprio JAR está plasmada, com clareza, no jornal A Nação, n.º 344, de 3 a 9 de Abril de 2014 (página A20). Prova documental irrefutável.

É uma vergonha indescritível, inigualável, reveladora. Que situação!

E por parte de um indivíduo que se diz “democrata” e pretende avaliar, imaginem, o cumprimento da Constituição e dos seus princípios nucleares, incluindo a separação de poderes! Já não existem ESPELHOS neste mundo?

Quem é, afinal, o grande “inimigo da sociedade aberta”?

Numa democracia minimamente desenvolvida, se um político fizer algo parecido, poderá ser criminalmente condenado (tendo em conta a gravidade do tipo-de-ilícito) e desaparecerá, por completo, da esfera pública, sem deixar qualquer rasto, por razões óbvias.

Aqui, nestas ilhas (des)afortunadas, o infractor julga-se um génio e diz até que não é “fundamentalista”! Ai se fosse!

Sempre ouvimos histórias caricatas de Mobutu Sese Seko ou Amin Dada, mas esses eram “figuras” típicas de Autocracias.

O mais triste, porém, é quando se cometem certos disparates em nome da Democracia Liberal. Nonsense upon stilts, diria J. Bentham.

Mas o comportamento perverso de José A. dos Reis não termina por ali. Infelizmente.

Mesmo nos dias de hoje, é preciso dizer, alto e bom som, que o ex-Ministro faz plágio, forma gravíssima de fraude intelectual e moral.

Sim, o cavalheiro rouba frases inteiras de certos escritores, assumindo-as, suavemente, como suas (para impressionar os camaradas?!) e sem citar a fonte original ou o verdadeiro Autor.

É mesmo deprimente.

Veja-se, por exemplo, o seu artigo de opinião intitulado “A era e o tempo da sociedade civil: pela partilha e responsabilização”, in https://opais.cv/a-era-e-o-tempo-da-sociedade-civil-pela-partilha-e-responsabilizacao/29/08/2018/.

Nesta parte, por exemplo, o dr. José António dos Reis faz plágio de forma claríssima, quando escreve: A nova cidadania requer sujeitos sociais ativos, definindo o que consideram ser seus direitos e lutando para seu reconhecimento, enquanto tais.

A frase não é dele, não aparece entre aspas e JAR nem sequer se refere ao Autor original, omitindo, assim, por inteiro, a fonte onde foi buscar, ardilosamente, a coisa.

A bela frase foi roubada deste documento: Juventude, participação e cidadania – uma revisão da literatura (é só meter este título no Google e aparece logo o respectivo “link”).

Ou então, já com mais informações, destoutro: Serviço Social – um caminho para a efetivação de direitos, in https://dspace.unipampa.edu.br/bitstream/riu/3597/1/CarlaRosaneRodriguesdaConcei%C3%A7%C3%A3o2014.pdf.

Este ensaio é de Carla Rosane Rodrigues da Conceição.

Leiam os textos estrangeiros com atenção, comparem-nos com o artiguelho de JAR e descobrirão muito mais coisas interessantes!

Adiante, minha gente.

Falando do processo judicial relativo à agressão que eu sofri, em Março de 2021, o sr. José António dos Reis, movido por um estranho ressentimento, acaba, entretanto, por mentir descaradamente.

Era capaz, com a sua lengalenga, de fazer avariar qualquer polígrafo!

O fulano, realmente, não é confiável.

Tenta criar, no seu apontamento de 25 de Janeiro, acima referido, a “realidade paralela” segundo a qual o arguido/condenado, Amaro Alexandre da Luz, cometeu um simples e banal crime de ofensa à integridade física, “sem recurso a armas”, como diz o douto JAR.

Tenta, no fundo, ilibar o agressor, chegando ao cúmulo de afirmar, atacando gravemente o Poder Judicial, que foi aplicada, ao arguido, uma medida de coacção (a prisão preventiva, mais concretamente) “sem nenhuma sustentação factual” (sic).

Ora, isso é pura patranha! Ou invencionice primária.

Para começar, o arguido é detentor de altos conhecimentos de karaté (facto do domínio público, que nem sequer carece de prova ou alegação: art. 472.º/2 do CPC), o que, por si só, é uma arma perigosa e mortífera e, como tal, de uso absolutamente proibido.

Aliás, questionado durante o Julgamento, o arguido/condenado confessou, expressamente, possuir conhecimentos de artes marciais.

Os FACTOS, assentes e provados, são estes:

Estava eu sentado a tomar tranquilamente um café, num conhecido restaurante da ASA.

O arguido entrou, “apresentou-se” e, acto contínuo, desferiu-me um violento soco na cara, que me fez cair e bater com a nuca no chão (de cimento duro).

Fui agredido, depois, com socos, pontapés, e o arguido até usou uma cadeira como arma de agressão.

Partiu-me, com violência, uma cadeira na cabeça, zona vital e sensível! Isso provocou-me, como é óbvio, uma “pancada” na testa e fez-me sangrar abundantemente. Fui depois assistido e suturado no hospital Agostinho Neto.

Fale com o Arquitecto Hermano Lopes da Silva, Adilson Valadares e outros que me viram ainda em pleno hospital.

Tudo isso (a conduta do agressor) foi inteiramente captado pelas câmaras de videovigilância do restaurante, prova irrefutável constante do Processo, o que levou o arguido, embora a contragosto, a confessar e admitir os factos.

É por isso, refira-se, que o Relatório Médico-Pericial afirma, peremptoriamente, que o ofendido, Casimiro de Pina, “correu perigo de vida”. Percebe agora, ó seu “analista” de serviço?

Trata-se, deste modo, de um crime agravado, p. e p. no art. 129.º do Código Penal (ofensa qualificada à integridade), incluindo, como se explica, rigorosamente, no meu Recurso, severas circunstâncias agravantes. Não vou entrar agora em mais detalhes.

Através da Sentença do Tribunal da Praia (= Processo-Crime Comum Ordinário n.º 99/2022), bem fundamentada, o arguido foi condenado a 5 anos de prisão efectiva e ficou, também, em prisão preventiva, tendo em conta a sua perigosidade e o concreto perigo de fuga, recortados, diga-se, a partir dos factos constantes do processo-crime e devidamente provados.

O resto são mentirinhas de JAR.

Regozija-se com o “habeas corpus” decretado, recentemente, pelo Supremo?!

Ora, isso é mais um sinal da sua ignorância em matéria jurídica.

O nosso STJ deu, neste caso, um “tratamento diferenciado” ao arguido.

Foi um erro crasso, no mínimo. Uma decisão inconstitucional, arbitrária e sem nenhuma guarida no art. 18.º do Código de Processo Penal.

Em Portugal, perante uma Constituição da República e um CPP bastante semelhantes aos nossos, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ-Pt) jamais admitiria isso.

A jurisprudência firme e constante do STJ-Pt vai, aliás, no sentido de que o habeas corpus não pode servir, em caso algum, para revogar sentenças ou medidas de coacção. Isso é inaceitável. É um exercício proibido.

É por isso que interpusemos, nos termos da lei, um Recurso no Tribunal Constitucional, cujo desfecho aguardamos serenamente, em defesa dos sagrados e indisponíveis Direitos, Liberdades e Garantias, a axiologia máxima desta II República. Símbolo da Sociedade Civilizada.

Assim se realiza o Estado de direito democrático. Não é com fraudes ou maquinações.



2 COMENTÁRIOS

  1. Bravo Dr Casimiro de Pina. Já esperava essa sua resposta. Até que desta vez foste muito branco. O homem tem aparecido, atrevido demais para o meu gosto, tentando dar lição jurídica a todas e todos. Inclusive pôr em causa a competência dos juízes (coletivos) que julgaram o Dr Amadeu de Oliveira!!!!!!
    tenho que reconhecer, no entanto, que não entendi la uma coisa! O dito cujo então é um camarada?! Se os meus botões não estão enganados o homem foi ministro na segunda Republica!!!!!!

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