Fake Minds, democracia e liberdades

0

Em Cabo Verde, a cultura de ofender ou difamar o outro, sem nenhumas consequências, tornou-se uma prática socialmente aceite pelas pessoas e pelas instituições públicas. Tornou-se um ponto fraco da nossa democracia. Talvez sempre foi assim. Povo de brandos costumes. Criou-se uma ideia generalizada de que qualquer um pode ofender e difamar o outro, gratuitamente. E não é falta de quadro legal em matéria de direito penal ou civil. E mesmo falta de prática. E falta de consequências. E de gente com determinação para levar este tipo de assuntos até ao fim.

Um jornal da praça anunciou em 12.03.2020 que o Tribunal da Praia condenou a um(a) cidadão a pagar 500 000 CVE de indemnização cível por difamação e comentários no facebook contra o principal dirigente de determinada associação profissional de direito público. Uma pedrada no charco. Finalmente. Mas uma pedrada que vale e pena estudar, replicar e massificar, sempre que as circunstâncias forem similares. E consta que após a condenação, familiares do réu foram interceder junto dos queixosos a pedir perdão, devido ao fato da ré não ter dinheiro e rendimentos suficientes para pagar a indemnização. E que tal indemnização seria descontada do seu rendimento mensal de subsistência. Se com 1 condenação tanto abalo, com 3 ou 5 queixosos, como seria? E se forem pessoas com historio de processos disciplinares e suspensão de salários, fica pior ainda? Dr. Geraldo Almeida, esses autos processos disciplinares no Estado são de consulta pública?

De facto a maioria dos típicos ofensores não geram rendimentos para pagar coimas e indemnizações. O tempo gasto a ofender não lhes deixa tempo para trabalhar e ter rendimentos dignos. Sobra-lhes tempo para ter ciúme e inveja. E para ficarem convencidos que a culpa das suas frustrações pessoais é dos outros. Afinal, o custo da má-língua e da difamação tem uma tradução monetária e pesa no bolso. Em tempos de pandemia então, fica mesmo pesado.

É triste haver pessoas e países que não acreditam no trabalho e no “self made”. Talvez não tenham encontrado esse exemplo em casa e nas suas terras. Empreendedorismo, leadership, impacto, resiliência, trabalho abnegado, estudar, persistir, réussir e, até, voluntariado, dão muito trabalho. Não é para todos.

Reza o artigo 484º do Código Civil que “quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou coletiva, responde pelos danos causados”. Uma queixa ou petição inicial copy-paste mudando apenas a identidade dos queixosos e réus, resolveria muita coisa e a baixo custo.

As liberdades criam uma grande autoestrada às pessoas em sociedades livres e democráticas. Mas é preciso algum cuidado. Todas as estradas são altamente regulamentadas por códigos de estrada, semáforos, polícias de ordem pública e sistemas diversos de sanções.

Desafio a quem tiver tempo suficiente para tirar um dia “fake” e anotar o número de ofensas por semana e por mês de determinados agentes. E depois, calcular a estimativa de indemnizações nos termos do 484º do CC. Conseguem pagar? Vão continuar?

Este artigo não é sobre política. É sobre a nossa sociedade e o nosso modo de vida.

Um optimo Domingo a todos