Germano Almeida e a tentação nacional-socialista

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Germano é um bom escritor ou, como ele gosta de dizer, um bom “contador de histórias”. Ou de estórias, quem sabe…

Mas não é só isso: é também, em termos de pensamento político, um reaccionário e um sofista que recorre a certos lugares-comuns para confundir o auditório.

A lengalenga germaniana não passa, apesar de tudo, de uma banal reprodução da velha e balofa propaganda estalinista.

Na sua última entrevista concedida a um jornal cabo-verdiano, o autor d’ O Testamento do sr. Napumoceno da Silva Araújo volta a atacar as privatizações da década de 1990 e a defender, sem qualquer hesitação, o Estado-patrão, ou “Estado-providência”.

É uma triste confusão!

As privatizações que Germano Almeida hoje tanto critica relançaram, de forma auspiciosa, a economia cabo-verdiana, depois da letargia e da estagnação do período do Partido Único.

Em 1990 a taxa de crescimento da economia cabo-verdiana estava próxima de zero, no meio de uma altíssima taxa de desemprego.

Vejam, por exemplo, os avanços que tivemos no sector das telecomunicações, com a CV Telecom e a abertura do mercado.

Mas os admiradores da planificação estatal centralizada não querem saber dos dados estatísticos. Só lhes interessa o ódio ideológico, movido por factores irracionais.

A manipulação dos sentimentos é, de resto, um traço típico do fascismo.

A história do século XX é praticamente a história do fracasso monumental das ideologias totalitárias, mas parece que o douto escritor crioulo nada aprendeu com ela.

A fantasia continua intacta, como dantes, pontuada, na névoa densa de uma utopia genocida, por mitos infantilizantes e desprovidos de qualquer sustentação lógica.

Jean-François Revel escalpeliza, minuciosamente, as patranhas dos “clérigos” da esquerdigreja num livro fundamental: A Grande Parada – Porque sobrevive a Utopia Socialista (2001).

O socialismo é a “filosofia” da miséria e da ditadura e não funcionou em nenhum lugar do mundo. Jamais.

Fracassou sempre e clamorosamente, mau grado as suas piedosas intenções de base.

O que move então, em pleno século XXI, a apologia do socialismo totalitário e das suas teses económicas por parte de uma certa elite?

Ignorância? Dificuldade em assimilar as lições da história? Oportunismo político? Ressentimentos pessoais?

Ouso dizer, para lá das brilhantes explicações de J.-F. Revel, que é uma mistura de tudo isso, e de mais alguma coisa.

O socialismo é uma crença tola, contraditória e improdutiva, aquilo que Raymond Aron designava precisamente por “religião secular”.

É o íncubo dos intelectuais, da chamada “inteligência”, afinal tão desprovida dela, como alertava, com mordacidade britânica, o saudoso e imenso José Osvaldo de Meira Penna, um dos maiores pensadores brasileiros de sempre! (Permitam-me, já agora, esta breve confissão, como preito de homenagem ao ilustre liberal desaparecido em 2017: estava eu a intervir numa conferência internacional em Cascais, a convite do actual Director de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa; a plateia era vasta e compunha-se de nomes sonantes da América, Inglaterra e vários outros países do mundo; Meira Penna, quando terminei, veio ter comigo, acompanhado da sua esposa, uma encantadora senhora norte-americana; dirigiu-me, humildemente, palavras de grande significado; apesar da idade avançada, fez questão de ir imediatamente ao hotel buscar um conjunto de livros, que me ofereceu carinhosamente, e com autógrafo pessoal; foi, para mim, um dia inesquecível, que guardarei para sempre na minha memória; aos jovens do meu país deixo este desafio: leiam, por favor, os livros desse grande Mestre brasileiro, uma fonte inesgotável de sabedoria, bom humor e qualidade literária; são as tais leituras que interessam, e que fazem a diferença).

Há um ponto decisivo que Germano Almeida não percebeu: a economia estatal planificada não significa (apenas) o controlo da infra-estrutura económica e dos chamados “bens de produção”. Longe disso.

Tem um significado mais amplo e determinante, quase oculto.

Quando o Estado controla efectivamente a economia, acontece uma coisa subtil que Milton Friedman analisou primorosamente nos seus livros: o declínio (também) das liberdades políticas. De todas elas.

Ou seja, o recuo da democracia e dos seus irrenunciáveis fundamentos materiais. É preciso esclarecer a nossa gente.

O Estado é sempre necessário e foi, historicamente, a tradição LIBERAL, de John Locke a Tocqueville ou Amartya Sen, que evidenciou este ponto, com clareza, prudência e racionalidade.

Só há dois grupos radicais que profetizam o fim do Estado: os anarquistas e os comunistas. O resto é treta.

O que os liberais e defensores em geral da dignidade humana preconizam é, todavia, um Estado civilizado, que respeita o espaço natural da sociedade civil.

O Estado é uma organização instrumental, “de segundo grau” (J. Baptista Machado) e deve cingir-se, por isso, à sua estrita dimensão ôntica.

Nada de trans-personalismos tardios. Injustificáveis.

O Estado foi criado pelo Homem, para servir todos os homens, sem os amesquinhar.

Há que não confundir o social com o socialismo e o bem-comum com o comunismo.



7 COMENTÁRIOS

  1. Ele foi deputado do partido que fez as privatizações. Depois foi a zanga com o Carlos Veiga e a partir daí assumiu toda a oposição possível ao MpD. Esqueceu se do partido único, das torturas da polícia política. Eu não sei o que aconteceu para ele passar a criticar de forma feroz tudo o que vem do MPD e de Carlos Veiga.

  2. Criou-se um expectativa muita alta à volta do germano com a Democracia lá por ter sido ele a liderar o recolhimento das assinaturas em São Vicente, para a legalização do Mpd. Verdade seja dita que também foi ele o primeiro abandonar o barco em São Vicente e a liderar o movimento para a destruição do Mpd na ilha. Creio que o problema do germano não era ideológico mas sim uma ciumeira doentia contra o Carlos Veiga. Atacou o Veiga em vários ângulos e muitas vezes a rasar um nível de pobreza intelectual tristonho…a ponto do CV um dia já cheio, terá dito que do germano gostava dos livros que escrevia menos como profissional e homem. É aliás o germano que num gesto envergonhado de pedir desculpas terá dito um dia que não sabe pq entrara para o Mpd quando o Paigc o tornou rico. A partir daí o Paicv pegou-lhe e explorou-lhe até hoje….O comandante depois de ser eleito presidente financiou-lhe como contrapartida um álbum de fotografias a que chamou de livro e que esgotou num ápice porque foi colocado direitamente a edição de 5000 exemplares pela Presidente da República. Portanto deixem lá o homem a ruminar os benefícios do socialismo em nome do partido único…só não vejo pq ainda tira proveito das calças roladas.

  3. Fui dos primeiros a denunciar a “trapicharia”, de trapiche, deste gigante de mais de dois metros de altura, mas de um diminuto cérebro. Fui também dos primeiros a denunciar este enorme desserviço do Expresso. Não compreendo como pode o Humberto Cardoso critcar Carlos Veiga por este ter aceite uma condecoração que leva o nome de um marxista e ditador e ao mesmo tempo o Humberto oferecer palanque para que marxistas ampliem a sua voz contra a nossa democracia liberal.

  4. Um esclarecimento: Germano nunca foi escritor. Mas sim um profanador aos factos relatos em processos, civis ou criminais que ele transforma e narrativas e as publica em livro. Alias, a Associacao de Escritores Caboverdianos sabendo disso, nunca teve a coragem de denunciar esse peculato literario.

    • Pois, deve ter comprado o prémio Camões com os dinheiros ganhos na campanha para o comandante PP

  5. É verdade! Caro CasiPina.

    Sou um tanto ou quanto conservador com os meus hábitos. Há anos que habituei-me a corta o cabelo aqui no bairro onde a Terra é Branca num barbeiro da ilha do Fogo. Ele emigrou para os States e a partir desta data fiquei-me a fazer o meu corte in house.

    A tua análise irá chatear e mexer com muita gente que gosta de caviar e cocktail!

    Mas enfim deixá-los… Costumo dizer que até Padre Campos já não dá missa de graça.

    É sim como disseste e bem! É uma triste confusão!

    Só há dois grupos radicais que profetiza o fim do Estado: os anarquistas e os comunistas, o resto é treta;

    Há que confundir o social com o socialismo e o bem-comum com o comunismo.

    Peço-te desculpas para acrescentar um ponto!

    A culpa está no pecado mortal da escolha. Para eles em primeiro lugar está a IGUALDADE para só depois escolherem

    a LIBERDADE.

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