As divagações e a infinita truculência de JMN – ainda a propósito da política externa e do posicionamento estratégico de Cabo Verde

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Há cerca de um mês, num jornal de grande circulação nacional, o Dr. José Maria Neves (JMN) escreveu sobre a política externa cabo-verdiana.

A pose, como sempre, é de…“estadista”, a la Churchill, dir-se-ia, mas o conteúdo, no meio de uma prosa castiça, é de um maquiavelismo barato e super-enganador, do princípio ao fim da longa parlenda.

JMN é um mestre, reconheça-se, de “meias-verdades” e da truculência política empacotada.

É o rei, nestas plagas do Atlântico, da conversa fiada! Nisso, ninguém atinge os seus calcanhares.

Começa a sua putativa “reflexão” com uma mentirinha ingénua de militante de província:

“Em 1975, na apresentação do Programa do Governo, no Mindelo, o Primeiro-Ministro Pedro Pires define as linhas da política externa…”.

Ora, naquele tempo, 1975, NÃO HAVIA nenhum programa de Governo.

O Governo de então, fiel à sua linha ideológica de fundo, decorrente do totalitarismo revolucionário, limitava-se, apenas, a seguir a orientação do Partido, “força, luz e guia do nosso povo”.

Vigorava, pois, o sistema do Partido-Estado na sua máxima força, coisa que o sr. JMN tenta, agora, esconder a todo o transe.

O Estado era o PAIGC, mais as suas “organizações de massas”.

Depois vem a velha ladainha de que Cabo Verde e Pedro Pires estabeleceram uma política externa “responsável” e coerente, com base na igualdade entre os Estados e no “respeito” pelos sagrados “princípios das nações Unidas” (sic).

Ora, isso é, também, redondamente falso.

Como é que uma DITADURA de cariz marxista – instalada em Cabo Verde, com o selo oficial, pela LOPE, essa “pré-Constituição” de viés oportunista… – pode respeitar, por exemplo, os princípios da Carta das Nações Unidas ou, pior ainda, da exigente Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948? Jamais.

Trata-se de um perfeito absurdo lógico. E axiológico.

A citação de Renato Cardoso também não colhe.

O Dr. Renato, recorde-se, sempre esteve enredado num mar de contradições, pouco exploradas, aliás, pela historiografia pátria.

O livro-“tese” de Renato é muito famoso e, bastas vezes, louvado pela “inteligência” verdiana, mas destaca-se, lamento dizer isto, por uma angustiante falta de bom senso e visão de longo alcance.

Como não perceber, por ex., que a opção por uma “política de paz” (sic) é algo incongruente – absolutamente incongruente, até – com uma política externa de “não-alinhamento”, a cartilha oficial do regime desde 1975?

Bastava ler um Jean-François Revel (Comment les démocraties finissent, de 1983) para ver que a coisa é, deveras, de uma tontice irremediável e prenhe, enfim, de erros históricos graves.

A malta navegava em bases falsas e fazia uma propaganda de baixo nível. E nada mais.

Faz-nos falta, 43 anos após a independência nacional, um Centro de Estudos Estratégicos…a sério!

Porque o célebre não-alinhamento era, na verdade, um esquema subtil, um auto-engano chapado, um engodo ideológico, uma farsa sem igual: era, sim, e sempre foi, um “não-alinhamento” COM o comunismo internacional, fonte segura, claro está, de imensos conflitos, instabilidades militares e guerras por procuração.

A própria II Guerra Mundial, com todo o seu imenso cortejo de destruição, deve ser debitada na conta político-estratégica da URSS e da sua perversa doutrina revolucionária (ver, por todos, e sem tardança,http://www.olavodecarvalho.org/urss-a-mae-do-nazismo/).

Isto obriga-me a repetir aquilo que eu alegava num recente artigo de opinião, escalpelizando, tranquilamente, os complexos de uma certa “elite” nacional-socialista:

“Continuamos a celebrar as ideias tolas da Conferência de Bandung!”.

Certas criaturas vivem, efectivamente, em 2018, mas a respectiva alma deambula, qual espectro sem rumo e periclitante, algures em…1955!

Continuando a sua saga de “não-ditos”, JMN fala, ansiosamente, dos Estados Unidos da América como “…um dos mais importantes parceiros de Cabo Verde”.

Mas, manhosamente, não diz “como”, nem porquê!

A Verdade é como o azeite, todavia.

Isso foi possível, sublinhe-se, depois da Constituição de 1992, que sintonizou Cabo Verde com a CIVILIZAÇÃO.

Isto é, com a Liberdade, a Democracia e a Boa Governação. Bandeiras éticas inquestionáveis.

Como escrevi há muitos anos, a Revolução Coperniciana na Diplomacia cabo-verdiana é uma esplêndida conquista do MpD, estando hoje o PAICV, já sem qualquer alternativa, obrigado, um pouco a contragosto, decerto!, a seguir o alto rumo traçado pela “Constituição da Liberdade”, utilizando um símile de F. Hayek. Não há voltas a dar.

Foi nesse quadro, e só nesse quadro fundamental, que Cabo Verde alcançou os 2 “compactos” do MCA, criados, a partir de 2004, pela administração Bush, para financiar a consolidação da democracia em África.

Com os “valores” do Partido Único (1975-1990), isso jamais seria possível.

JMN reconhece, por fim, que a cooperação militar com os EUA estava num beco sem saída, apesar do “ambicioso programa” apresentado pelo então Ministro da Defesa de CV ao seu congénere norte-americano, Chuck Hagel.

Os EUA queriam o SOFA. Sem isso, nada feito.

Este acordo de cooperação NÃO pode ser visto, portanto, como “um tinir de sinos facilmente dispensável”, retomando a sugestiva fala de Nietzsche.

As vantagens para Cabo Verde serão enormes, como resulta, aliás, da confissão do ex-Primeiro-Ministro: veremos a nossa Guarda Costeira modernizada e capaz de patrulhar, diga-se, a nossa vasta Zona Económica Exclusiva – com externalidades muito positivas no tocante ao combate aos vários tráficos e à pirataria marítima… – e receberemos, igualmente, vários navios, aviões e helicópteros dos Estados Unidos da América, reforçando a nossa capacidade técnica de reacção.

O próprio sector da Saúde, acrescento ainda, ganharia imenso (pensemos, desde logo, no problema da evacuação dos doentes para os hospitais centrais do país, que tanta celeuma vem causando nas “redes sociais”, etc.), assim como a área sensível da Protecção Civil, em caso de erupções vulcânicas ou outros desastres naturais, num arquipélago tão exposto como o nosso, por mero capricho da Natureza.

O Governo do MpD (e, já agora, o Parlamento nacional) fez muito bem em avançar com este acordo.

Essa aproximação é do interesse estratégico de Cabo Verde.

Acordo esse que o Presidente da República poderá ratificar ou não. Quid iuris?

Finalmente, e porque somos um Estado democrático de direito, ainda teremos, se for o caso, o Tribunal Constitucional para avaliar, com independência, os aspectos constitucionais, e decidir em conformidade.

Não há nenhum drama nisso, ao contrário das vozes discordantes.

Aguardemos com serenidade.

Não somos “revolucionários” sem bússola: prezamos, pelo contrário, as regras da nossa civilizada democracia constitucional.

Vivemos, livres, “sob o governo de Deus e das leis”, como intuiu magistralmente Alexis de Tocqueville.

Mas uma coisa é certa: num mundo tão inseguro, e com tantas ameaças à espreita, vale a pena ter um aliado de peso como os EUA ao nosso lado. É um conforto. E uma excelente notícia.

Precisamos, cada vez mais, dos EUA e da NATO.

Eles são, indiscutivelmente, a condição da nossa prosperidade colectiva e, acima de tudo, da nossa LIBERDADE.

A América do Norte é um país que sempre nos tratou com amizade e cujos valores adoptámos na transição paradigmática pós-1991.

Obrigado, senhor Primeiro-Ministro, por ter sabido escolher, correctamente, o nosso principal parceiro estratégico internacional!

OBS. Esta versão do artigo contém alguns parágrafos acrescentados, hoje, 17, pelo respetivo Autor.



2 COMENTÁRIOS

  1. Bravo Meu caro amigo. Hoje, mais do que nunca, é preciso calar e desmontar políticos da conversa fiada, representada pela truculência daqueles que, por não terem mais um pingo de dignidade de estarem calados.

  2. Excelente. Oportunismo e o ego de se auto proclamar como filhos ilustres e carismaticos da terra ha que ser desmantelado e posto a nu e cru que tudo nao passa de baboseira e puro falsidade para fazer o boi dormi. Os melhores filhos da terra, os doutores, os intelectuais enchem os livros que so tem lugar nos sacos e nunca em qualquer livraria.

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